
Maysa não é aquilo mas Maysa tem isto.
Os olhos de Maysa são dois não sei quê dois não sei como diga dois oceanos nõa-pacíficos.
(...)
Maysa reapareceu depois de longa ausência.
Maysa emagreceu
Está melhor assim?
Nem melhor nem pior.
Maysa não é um corpo.
Maysa são dois olhos e uma boca.
Manuel Bandeira
E a rua era escura e as casas eram pretas e eu vinha de longe. Eu estava repleto de desistência quando eu a vi lá ao longe mais desistente, talvez de modo igual que eu. Ela estava vestida de cinza, os cabelos desesperados e uma coisa foi gritando em mim. Eu sabia, era ela, a grande mulher. E a minha desistência foi ficando triste. Ela encostada naquele muro estava bêbada. mas a bebedeira dela é divina. Ela bebe uísque e o uísque se casou com ela e os dois são o par mais aristocrático, mais verdadeiro desta cidade, desta terra! O uísque para ela é cinzento, o violão, o samba, a chuva, a desistência. Eu não sei por quê mas ela é fabulosa nesta tristeza que até a mim me fascina. Ela estava em pé, bêbada, gorda, feia - e ela era linda! A dor dos deuses! A linda, a divina, agora só divina. Mas o que mais me agoniou foi a certeza da morte dela. E isto tembém é divino. Ela vai morrer. A cantora vai morrer. O samba modificado profundo vai morrer. O mundo da inutilidade sincera vai morrer. O cinzento dela me fascina. Ela está bêbada, sempre bêbada! E quando chove eu não quero me lembrar dela, nem da voz dela, nem das composições dela porque senão eu enlouqueço! Maisa você parece comigo mas a minha desistência que ser heróica, é guerra, é ferro, é sangue, é rock, é velocidade de motocicleta: mas a tua desistência fascina e eu te respeito Maisa, você é sagrada, e eu também bebo uísque mas para mim ele ferve, para você o uísque é cinzento.
Jorge Mautner, Deus da chuva e da morte
in "Maysa - só numa multidão de amores", de Lira Neto.
Quaresma