30 de dez. de 2010

A nado

eu ainda não cheguei.
e que vontade de não voltar mais!
mas para onde eu iria, então?
o outro lado ainda está tão longe,
a borda é só um vislumbre e o chão tão impossível...
batem-me umas ondas no alto das Costas,
vai ver que minha nuca já virou areia,
minhas orelhas, maguezal.
vai ver que eu ainda nem fui?
vai ver aquela história de ser canoa de remo, de rodar e rodar os braços...
vai? vai ver?

23 de dez. de 2010

a namorada do saxofonista

a namorada do saxofonista desceu a rua escorregando na sola das próprias sandálias.
esta namorada que esfrega seu calcanhar áspero, grosso, esbranquiçado nas canelas do lindo saxofonista perde um cílio por dia ao coçar os olhos manchados de maquiagem.
quanta sorte jogada fora, namorada!

ela usa umas blusas com estampa florida, pano de muito boa qualidade.
ela usa um perfume de maçã verde, assim, meio azedo.
ela amarga uma dezena de desprezos.
ela é um vazo ruim,
flor mal-cheirosa
e é de lá do Chico Furado.

a namorada do saxofonista arranha Lover Man na gaita diatônica.
"toca como quem canta", já diria seu namorado.
às vezes tocava cantando, mas isto não é como assoviar e chupar cana.

suas sandálias frouxas, sua cor de burro fugidio, sua voz de ceda rosa...
ela sempre há de voltar para me fazer companhia.

17 de dez. de 2010

Para Doxo agudo



este mundo é pequeno demais para uma existência tranquila.
ascese e verão:
capullo y mariposa.



DOXOLOGIA: s.f. (Do gr. doxologia, pelo lat. tard. doxologia.) 1. Prece ou cântico cujo fim é glorificar a Deus. - 2. Enunciado que se limita a reproduzir uma opnião de senso comum ou uma verdade aparente.
Dicionário Larousse Cultural da Língua Portuguesa, 1999

10 de dez. de 2010

NOTÍCIAS DA ÁGUA


MOVIMENTO ALLEGRO (A)

Penso na água bebida nestes meus dedos tortinhos
Tua boca, em música, sorviendo-a vitalmente.

Via as cortinas úmidas lançando um alegre cheiro no ar:
- Aaahh! Ela se mijou toda!

Penso na quantidade de chagas que já me lambeste
Mais do que penso naquelas que ainda vai me causar.
Penso em todas as águas que eu recusei hoje só para poder ver as tuas:
corpo a dentro, corpo a fora.


MOVIMENTO ALLEGRO (B)

Vai virar esta carinha para fazer dengo?
Vai uivar que está sozinha para causar dó?
E a pipa no céu azul correndo?
De nós duas só vai restar uma só.



para a Bolinha, minha cachorra

29 de nov. de 2010

etnografei minha descrença.
está feito o relatório final.
nos "Anexos", uma carta doutrinária de auto-crença fundamentalista destinada a expirar vinte e quatro horas depois de sua primeira leitura.

um recorte longitudinal ergue-se qual farol na página 37 (seção Metodologia):
o sistema mostra-se vertical,
uma pletora de ontens e anos retrasados
acumulados uns sobre os outros,
negativos de tempos pré-históricos,
modernidades arcaicas, minha escada para o céu.

o passado parece ruir.
podre e roto desmoronando seus sentidos para uma análise sincrônica.
o passado parece ruir para um presente oroboro.

etnografei minha descrença.

ontens retrasados.
o hoje parece ruir.

26 de nov. de 2010

mercúrio na casa oito

lechuza,

lucida en la oscuridad.

22 de nov. de 2010

imagens de quatro dias de disciplina

"solilóquio sem fim e rio revolto"

Jorge de Lima


 o que está para acontecer?!

não durmo com medo de perder meu próximo pensamento.

mulecagens e desprezos vêem como reflexos nervosos a um mundo que se mostra cada vez mais estranho
cada vez mais próprio
e lindo
e ridículo.
cada vez mais.

imagens de quatro dias de disciplina II

BOEMIA DE FIM DE SEMANA
cruzar esta aurora é travar o cabo da tormentas em direção à descoberta de que mais uma segunda-feira se ergue para o êxtase sepulcral de mais uma semana de corrida mediocridade.




(pensei)

15 de nov. de 2010

1

nina simone fere-me a carne.
e vaza-me a solidão neste corte cínico.
sem ela não Sou.
melhor ir dormir.


2


o que eu tenho não pode ser chamado
de "dor nas costas" ou "dor de cabeça"
porque não é ruim.
como eu disse - embora você não tenha me ouvido -
não estou interessada em remédios.
isto é raro, senão único.
agora, por exemplo, a dor já passou.
ou talvez ela esteja continuando, mas no seu inverso.
mas aí,quem sabe, não seja dor.
estranho como o melhor parece ser a normalidade
 - ou seu ideal: correr atrás de uma saúde de ferro para na primeira chuva, inferrujar.
como se alguém realmente conseguisse chegar a isto.
a noção de saúde é construída.
à merda os construtivismos.
estou doendo.
quero uma realidade dada.


3 (Odisseu)


homero sim seria um (re)encontro.
mas este menino, é vaidade.


4

quase todo dia eu passo perto de uma rua, a Jorge de Lima.
outro dia peguei o livro e LI o tal Lima:

"Solilóquio sem fim e rio revolto".


5


"vida inteligente na madrugada"
solidões não serão perdidas.

12 de nov. de 2010

Eva

Rhesus, rezo, Jesus!





Eva espreitava quando o seu primeiro homem
Saiu por detrás das bananeiras,
Como um Tarzan, abraçado à macaca Chita,
Comido o fruto admitido.
Enciumada trepou nas macieiras
E rompeu o selo do seu prazer:
Foi para Nova Iorque fazer compras
Com o cartão de crédito do glutão.
Por isto hoje temos no sangue
E em Rhesus a prova
Dos crimes.
Fator Rh negativo: ascende a Eva
Fator Rh
Fator Rh positivo: descende de Adão.

Luís Carlos de Oliveira "Aseokaýnha"

11 de nov. de 2010

[em processo/rascunho público]

desse modo me carece tanta coisa!
que quando olho para trás à procura de minha cálida Eurídice,
ela me sorri numa agonia tranquila, desfalece e vira chuva para fortalecer meu chão.
me carece uma só coisa:

(a terminar)

6 de nov. de 2010

"Tudo quanto foi moça caiu no samba. Uma não ficou.
Chegava num ponto, de tanto sambar, elas iam diminuindo.

Ficandinho pequenas, ficandinho pequenas até caberem no pandeiro deles. Ai entravam. Lá dentro continuavam a sabar.
Páquete-papáquete-páquete-papáquete!

Quando a última ialê entrou no pandeiro do negrinho...o cavalo dele falou: - S'imbora, Dudu!
Ninguém ficou espantado do cavalo dele falar, não.

Mas aí se viu que ele não era Ossanha.
- Peraí, Calunga - o negrinho respondeu.
Tacou a mão no pandeiro. Tão forte que até hoje se escuta.

O negrinho foi crescendo, crescendo, crescendo. As ialês, que tinha ficado pequenininhas para entrar, voltaram ao tamanho delas mesmo. O negrinho de um pé só levou todas pro seu Candomblé, do outro lado do mar.
Era Dudu Calunga."



Trecho do livro (infantil) "Dudu Calunga" de Joel Rufino dos Santos,
ilustrações de Zeflávio Teixeira.
Coleção Curupira; Editora Ática, 1986





*****

Eu estava dormindo e acordaram-me
... e me encontrei num mundo incerto e louco!
Mas quando eu começava a compreendê-lo
um pouco,
já eram horas de dormir de novo...

Mario Quintana

é com este que eu vou!

2 de nov. de 2010

Se
eu tivesse uma alma ela viria andando pelo corredor
e ficaria recostada no batente da porta toda dengosa, meio amarela,
olhos moles, pulmões chiados.
Chegaria como quem ah, fui ali na esquina e voltei, eu sempre volto; me desculpe, mas se fosse por cigarros não voltaria mais.
E então ela veio.
trouxe a cabeça eivada pelas pancadas contra os azulejos do banheiro.
Antes fosse tombo, queda de tropeço, susto.
Não foi.
Que travessa esta danada autodestrutiva!
Arteira!

Pobr'alma minha agarrada qual carn'aos ossos àquilo qu'exala dor'i ressentimento!

"Vi por gran mal de mi,
pois tam coitad'and'eu."
D. Dinis



Se eu tivesse uma alma...
Não a tenho.
Graças a deus.

28 de out. de 2010

COLO

eu me curvo
de braços abertos e abaulados
eu me sento
de cabeça baixa e olhar difuso
eu me guio
no ritmo sereno do que respiro.

eu me tranço rede
para teu sossego
eu me amasso folha
para adormecer tuas aflições.

24 de out. de 2010

Foreign núbia

Se Lucy surgisse me parindo de uma gestação milenar
E me dissesse: "filha, volte ao teu berço"
Nem assim eu voltaria a me postar
debaixo d'árvore para atiçar feitiçaria!

Se tivesse minhas crianças de pele escura e nariz estreito

Ainda que eu quisesse ir para o oeste nascer junto ao Nilo
Terminaria a noite mediterranemente só, ilhada no Egeu, ferida de vida.
Ah, antiga Abissínia! Jah bless! This is not for me.
Antes tivesse ficado com aquela torta que até agora faz saudade no meu estômago!
acho que não temos outras vozes como a de Dolores Duran.
me lembro de alguém tê-la comparado às cantoras americanas de blues e jazz.
ela com seu inglês impecável.

"Aos 16 anos, foi contratada pela Boate Vogue e passou a se chamar Dolores Duran. Nesta fase de shows noturnos, ela conheceu Ella Fitzgerald, que elogiou sua interpretação de 'My Funny Valentine'."*


que comparação o que!
 
Nossa! "Conversa de botequim" com esta mulher faz qualquer sorriso ...
 
!
 
... apesar ser 00:48 horas de 24 de outubro, como ainda não durmi, é dia 23.
e foi num 23 de outubro que Dolores morreu. e eu não sabia, acabo de descobrir.
que susto! que arrepio! corri falar para alguém!
pai, esta falsa-coincidência salvou minha lua cheia.
estes pequenos encontros tão rápidos e aparentemente frágeis alimentam algo mais que a alma.
pôxa vida!
esta sim é uma promiscuidade que vale a pena. o resto é putaria (com todo o peso moral que a palavra traz). 
 
 
 
 
  ainda sim não era sobre isto que eu ia escrever.
 
 

19 de out. de 2010

DESTE MAL NÃO PADEÇO MAIS

como descer do teu colo e mergulhar de novo neste meio de tarde morno e sem brisa?
como ficar assim à merce de teus afagos e da solidez de suas coxas?
como fui me deixar ficar?
porque sair andando por aí sem trazer ao menos, um de teus braços como uma estola de pele nobre por detrás de pescoço, por cima do ombro?
como apagar todas as imagens do teu antebraço com as elevações dos tendões volta e meia esticados, linhas infinitas até teus dedos bonitos. mãos muito me importam, dedos e unhas bonitas.

não trago nada, tudo ficou pelo caminho.
ficam ao longo daquelas estradas artificiais de mil curvas os minutos de você em mim; minha dose de simplicidade absurda.
rasgando-me a existência a anunciação de um vazio sem nome, qual saudade de mãe morta.

sem nomes, tanto tua falta quanto tua presença, percorrem-me o amor-não-feito sem restrições e burocracias, sem bater ponto ou qualquer outra coisa.

mas ainda sim não há Amália Rodrigues
não há Maysa Matarazzo
não há Orfeu, Eurídice ou Vinícius!

de repente não existe nada além da fantasia cavalgando "solitária e fim" tal qual uma amazona de arco em punho, sorriso ameno, "mulata pele escura dente branco"
indo por seu caminho, seguida pelo pensamento
de um amigo de braços sem fim lhe espera até sua volta pela lua cheia
seguindo sua vida, qual pássaro contente, "vai tua vida, estarei contigo"*.

OS MALES É QUE PADECERÃO DIANTE DE MIM




*Versos de e referência ao "Monólogo de Orfeu" de Vinicius de Moraes

17 de out. de 2010

Ultimamente "não posso" ler
Mas é a única coisa que
Quero e Devo fazer.


Porque vai que tanta admiração...
Vai que tanto encantamento e transcendência...
Vai que tanta suspensão das defesas
Aquela vulnerabilidade
Aquele armistício da mediocridade
Vai que a sensibilidade aguçada demais triplica a vitória de futuras feridas?!


Tudo isto para:
Olha só:

"Me deixa conviver
com a certeza da minha
da nossa
Burrice
em não se parear de vez.

Tenho certeza que talvez irá passar"

Allan da Rosa

Trecho do poema "Favor",
na íntegra neste LINK.

"Só numa multidão de amores" - Maysa

é uma da manhã mas não deveria ser.
um fela roubado.
um xilofone and two thousand black.

acabei de descobrir que gosto de xilofone
e que tenho mesmo que providenciar uma t(r)oca de silicone (?) ou me livrar destes cabelos.
altough there's no time for intensive treatment.
think about it!
two thousand black!

descobri-me estrangeira na minha cidade
imigrante de um mundo interrompido
anestesiado na sua própria penumbra
de um alvorecer de cabeça para baixo.

acabei de descobrir que gosto de xilofone
e que este sax é o catéter na minha veia.
"bom é este jazz"
"beijo na bochecha também é"


Teresa,
o primeiro era poeta, sereia de cantos seminais.
forjava os versos de puro ferro do negrume
das gerais.

o segundo era sem rima
puxava o "r" nos extremos da cidade
veio de baobá direto da Faculdade.

o terceiro me falou:
para onde você quer ir?
pega o praça da sé.
mas eu o traí e fui de campo limpo.



o poeta
o professor
o porteiro.


meu primeiro beijo tinha som de "p".
meus últimos amores duraram um dia.
o primeiro dia de verão desta primavera
foi assim uma chuva dezembrina.

são duas horas mas não deveria ser.
algo deveria ter passado junto com o tempo.
não foi, ficou.
pensar o que não se vive não é vida.

mas vai que é assim, uma chuva dezembrina!


"tudo passa"



12 de out. de 2010

Incorporação desativada, mas este é o link do vídeo da Teresa Cristina gravidinha cantando Morada Divina: http://www.youtube.com/watch?v=l74PO2v3s9M&ob=av2n



E este é um trecho do filme "Orixás da Bahia":




Ora yeyeô!

suspiros de limão



que tenha sido a neblina
uma névoa agridoce,
a cegueira das paisagens.

que tenha sido.
e não o é mais.

por mais que forte
já foi
por mais claro
foi impressão.
até agora gravado nos meus desejos
safados e puros.
mas não sobrará nada para frustar (parece nome de picolé de fruta ou suco refrescante).

que tenha sido
e foi.
como tudo vem sendo.
vencendo.
o prazo de vida das frustações parece se esgotar.
a validade das solidões, a sobrevida do ressentimento.

amanhã acordarei cedo como se fosse nadar.
irei à missa e chorarei mais do que hoje
voltarei para casa
lerei aquilo que devo e quero
suspirarei
arrumarei minhas bagunças
e me encontrarei nos meus traços.

seria muita exposição revelar aqui meus planos para um dia de feriado? (depois de mais de dois anos de blog você vem e pergunta isso?!)
ou as minhas dores?
as frustações?
os desejos?
os (des)amores?
omitir uns nomes?
explicitar outros?
mas as projeções para um futuro próximo (como dormir daqui a 15 minutos) não passam de ficções, assim como todos os temas sobre os quais construo os textos.



e quando eu me dou conta a maré já me levou para longe de mim.
longe demais para voltar.
seria de amargurar se não fosse eu meu mar.

preciso ler muito mais.
mas agora vou dormir.

11 de out. de 2010

Carta-poema para meu primo-irmão Paulo Rogério
 (este, nome composto sem hífem,
diferentemente dos outros termos 
compostos deste título.
às vezes só duas palavras dão conta
do sentido de uma relação,
de um sentimento,
de um título de poema,
do nome de um blog,
de um cheiro... às vezes nem isso)

Lembro
Dos teus dedos desenhando
o ninho
e teu olhar era o passarinho
que fora dele ficava.
teu peixe não era de água

mas era nela que você vivia
uma vida toda apertada
nunca cabendo
aquele Além que você queria.

sempre um dia-recomeço
sempre uma nova escova de dentes
sempre um toma jeito rapaz
sempre um novo galo para
acordar tua cabeça machucada.

mas o que foi que você perdeu
que não sossega este juízo?

meu sonho com dragões chineses,
os traços que nunca te fiz...

agora está tudo meio diferente.
eu ando escrevendo muito.

a vida por aqui anda ligeira
muita fralda
leite e mamadeira!
que fome de povoar!

Vejo
Mas este prato de mingau anda estranho
e sobre isto queria muito conversar
uma gana, um medo...
percebi algumas escamas e uma enorme necessidade de voar!


setembro de 2010

10 de out. de 2010

"NUMPIRANÃO, RU!"

não quero ser nada além do que eu já sou.
o que eu sou está bom, vai bem.
aruanda
bom
bem.

esse negócio de movimento retilíneo uniforme
ou uniformemente variado não me vai, não desce nem sobe.
luzes nos túneis,
linhas do tempo.
não, não.

um sistema de desenvolvimento rizóide de movimento circular!
jesus maria josé!
e comoé?!
é bom
bem, aí sim vem.

9 de out. de 2010

Soledad I (morning)

"mi mujercita oscura y clara,
mi corazón, mi dentadura,
mi claridad y mi cuchara"


meu pensamento desencaminhado
meu vazio crônico
meus raios de solidão vazada na tela da peneira


minha evidência nas manhãs torcidas
meus sorrisos nas horas esquecidas
minha constância ébria
minha distância prolongada às chances perdidas


"mi sal de la semana oscura
mi luna de ventana clara"


minha carne continuada
minha carência batizada
minha precisão nomeada
meu nó na garganta
meu pulo no coração
meu fervor nos olhos


"te amo, te amo, es mi canción
y aquí comieza el desatino."
até que este dia acabe.
até que isto tudo desabe
antes do Amor chegar.



*trechos de Cancion del amor, Neruda

6 de out. de 2010

Revisitando um livro, encontro este à lápis na última página:



Página 346

Ai, maiquiquerê
Pra parti o coração
Qui faiz quatro dele
Mas será que essa nóiz cola?
Cola?
Lançando minha sorte
Nas burra destes dias?!



maio de 2010

4 de out. de 2010

Let me Chet you, boy...

uma vontade de escrever mas não tem saído nada.
melhor mesmo tem sido os outros: seus escritos, imagens, sons, as palavras todas.

vi Chet por aí, na internet, depois de muito muito tempo.
dá pra acreditar na suavidade da voz desse cara?
na primeira vez eu não acreditei.
e nas últimas eu já estava enjoada.
agora é outra coisa.









Como diz minha afilhada:
"tá, tá bom
brigada!
té manhã!"

30 de set. de 2010



"Eis-me aqui, recomposto, sem um ai.
Sou o meu próprio Frankstein - olhai!
O belo monstro ingênuo e sem memória"

Mario Quintana

Eloqüência e decapitação

PIANO SUBITO STREPITOSO

- Arrancai-lhe a língua.
- E depois?
- E depois deveis lha devolver. Assim, quem sabe, terá finalmente algo a dizer.

- Arrancai-lhe a língua.
- E antes?
- Antes, nuca a teve. Mas nascerá por extração, assim como a liberdade entre os povos colonizados.

- Arrancai-lhe a língua.
- Onde? Na boca, no grito, nas manchetes dos jornais vespertinos?
- Onde não há riso - é neste lugar que a língua é mais fraca.

- Arrancai-lhe a língua.
- Fará diferença?
- Arranco a vossa. Então vereis que não há diferença para a língua em arrancar a vossa ou a de outro.

Pádua Fernandes
em Cinco lugares da fúria



"A espiritualidade do etnocídio é a ética do humanismo."

Pierre Clastres em Arqueologia da violência


PERMISSÃO II

Corramos.
Chegaremos antes de nossas solidões.

E será que é permitido "solidões"?

Permite-se
amores
pragmatismos
egoísmos
deuses
dores
as passagens a 2,90
degraus
e lápis-de-cores.

Só solidões estranha.
É feio.
É torto.
Quiçá, pecado.

Corramos.
Chegaremos eu e você
ao desconhecimento mútuo.
Cada um, um.
Nós, desfeito.
Aqui, só singular.

Permite-se.

setembro, 2010.

27 de set. de 2010

CANCION DEL AMOR


Te amo, te amo, es mi canción
y aquí comieza el desatino.


Te amo, te amo mi pulmón,
te amo, te amo mi parrón,
y si el amor es como el vino:
eres tú mi predilección
desde las manos a los pies:
eres la copa del después
y la botella del destino.


Te amo al derecho y al revés
y no tengo tono ni tino
para cantarte mi canción,
mi canción que no tiene fin.


Em mi violín que desentona
te lo declara mi violín
que te amo, te amo mi violona,
mi mujercita oscura y clara,
mi corazón, mi dentadura,
mi claridad y mi cuchara,
mi sal de la semana oscura,
mi luna de ventana clara.

Pablo Neruda


"e aqui começa o desatino":
como um tiro de largada
ou de misericórdia
Ah, esse Neruda!

26 de set. de 2010

O homem sábio e desdenhoso
olhou-me com a indiferença
dos camelos pela lua
e decidiu orgulhosamente
olvidar-se de meu organismo.

Desde então não estou seguro
se eu devo obedecer
a seu decreto de que eu morra
ou se devo sentir-me bem
como meu corpo me aconselha.

E nesta dúvida não sei
se dedicar-me a meditar
ou alimentar-me de cravos.

Pablo Neruda, trecho de "No entanto me movo"

Andar

por qual válvula escapar de mim mesma

depois dos pés atados aos pulsos
e das mãos pisando em ovos?

depois de cuspir merda
e chorar mêstruo?
mas escatologias não me seduzem mais.
nem as fibras cruas dos músculos em sangue me falam d'alguma verdade oculta.
nem mesmo a dor e a nostalgia indicam qualquer tipo de acesso à vida ou à tranquilidade.

não me importa a verdade.
nem mesmo os ocultismos.
o que importa agora é costurar solas nas minha luvas.
"no entanto me movo",

25 de set. de 2010

O autorretrato

No retrato que me faço
- traço a traço -
Às vezes me pinto nuvem,
Às vezes me pinto árvore...

Às vezes me pinto coisas
De que nem há mais lembrança...
Ou coisas que não existem
Mas que um dia existirão...

E, desta lida, em que busco
- pouco a pouco -
Minha eterna semelhança,

No final, que restará?
Um desenho de criança...
Corrigido por um louco!

Mario Quintana

21 de set. de 2010

Olha que fazia tempo que uma música não me tirava do chão e me dava um grande, grande alívio.
Ouvi inquieta, boquiaberta, dizendo "meu deus! meu deus!" e levando as mãos ao rosto, o que se tornou uma sessão de bofetadas ao longo do vídeo e do deleite da letra.





Geralmente quando gosto de uma música eu a ouço várias vezes seguidas.
Mas esta, depois de ouví-la pela primeira vez, não tive nem vontade, talvez não faça sentido, afinal, depois de tê-la: "poetas para quê?/ os deuses, as dúvidas/ pra que amedoeiras pelas ruas?".

"ou pra que serve uma canção como esta?"
Não sei.
Talvez para descanço e dispersão num dia de cansaço e tensão.

A letra é da Adriana Calcanhoto.
A Bethânia, que é hábito, desta vez foi só acaso.

19 de set. de 2010

"coisas, coisas, mais coisas..."

aqui tem muita brincadeira.
não devia ser assim.

e então me encontro bem no interior de mim
bem lá naquele nó.
nó de madeira.
e tem tanta gente lá!
nas suas infinitudes...
e eu sou tudo isto. do tamanho de cada um deles e de todos juntos.

a gente fica perdendo tempo com tanta tanta tanta besteira, porra!
não devia ser assim.

não quero mais.
e, no entanto, quero tudo
sou inteira bocas e olhos: fome e lucidez.

neste choro todo risonho,
nesta saudade eterna houve um reencontro:
a vida é seu próprio avesso.

"Livros, plantas, raça, luta,
vida, idéias,
coisas, coisas,
mais coisas..." - sou a mistura Deles; no meu mundo Nancy é a cidade Luiz.

Pelas palavras concebida.
Pelas palavras concebemos: a criação em cada sopro, é energia que nasce e vibra;
a palavra cria.

Respiro para poder falar
Mas estas saudades me perturbaram
Me impedem de criar minha noite
Todos os sonhos elas já espirraram!

CELESTAMINE nela!
Essa eu já sei de cor!
Mas tem coisa nesta vida
Que de alergias dão cabo bem melhor!

Agora o sono derruba. Passou aquele fervor.
A escrita volta à rotina, criando em círculos.
Quando eu quero a espiral.

A intensão é sempre falar sério.
E é fato que nestes tempos não há aquela dor.
Crescer sempre dói. Tinha me esquecido.
Sempre aquela surpresa ao lembrar:
tua boca é realmente a que eu desejo
teu dorso, onde quero estar
e não era mesmo assim que você dançava?!
estás em mim em todo e qualquer olhar.

fim de noite.


19 de setembro de 2010
- findo às 04:13 hr -
domingueira

Aruanda

17 de set. de 2010

Ibejis apaixonados

Margiando quereres
os meninos contornavam a pressa do rio
que desce pedra, empurra folha,
e cresce e corre e cresce e corre
revolvendo cascalhos, recriando mundos.

É melaço maroto!
E quede muro para te represar?!
E quede fôlego para te faltar?!

É melaço maroto!
Travessura com ginga
Na juzante perplexa, numa fox estendida à pura zombaria!

Neste leito afogueado de águas arrepiadas
Quem mergulha se afoga
e fica em brasa
e crispa o dorso
e quebra bonito
e freme gostoso
na Brincadeira de roda para tontear corações!


Omi Beijada!

aqui
e aqui

16 de set. de 2010

Pega ela!

Das dúvidas todas
Há uma que mais me mata:

Há ou não bela presa
Em solo fundo refugiada?

De todos os prazeres
Há um que mais me angustia:

O arfar suave do teu medo,
pro gozo de minha harpia.



14 de set. de 2010

Mario Quintana


Souvenir d'enfance

Minha primeira namorada me escutava com um ar
                                          [de cachorrinho Victor:
Todas aquelas minhas grandes mentirinhas eram
                                          [verdades para ela...
Para mim também!


A oferenda

Eu queria trazer-te uns versos muito lindos...
Trago-te estas mãos vazias
Que vão tomando a forma do teu seio.

Das utopias

Se as coisas são inatingíveis... ora!
Não é motivo para não querê-las...
Que tristes os caminhos, se não fora
A mágica presença das estrelas!

Manuel Bandeira


Porquinho-da-índia

Quando eu tinha seis anos
Ganhei um porquinho-da-índia.
Que dor de coração me dava
Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão!

Levava ele pra sala
Pra os lugares mais bonitos, mais limpinhos,
Ele não gostava:
Queria era estar debaixo do fogão.
Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas...

- O meu porquinho-da-índia foi a minha primeira namorada.




Cia. M&M: para noite toda e um pouco mais.

9 de set. de 2010

tu não me chegas
se cá já estás.

- e cajá manga, tia?

manga não, meu bem.
capaz que não.

6 de set. de 2010

ESBOÇO DE UMA BUSCA MARIANA

Onde está  Maria
Longe de toda Fineza transmarítima?

Onde está Maria
Agora que rasgo o Atlântico?

Onde está Maria, testemunha
Das minhas Lutas de Lama?
Dos sonhos de Abeokuta?

Onde está minha amiga
e seu esmalte descascado
suas roupas coloridas
seus surtos de raiva
nossas risadas?

Onde está Maria de Luanda a Pernambuco?
De São Paulo à ansia do resto do mundo?

Quede Fineza, e sua presença fugidia?
Quede Maria fronteiriça?

Mas do teu nome só sei o eco:
Na tua mãe
Na tua avó
Na mãe dela, naquela outra e na outra depois dela
a virar
a esquina,
a página do livro,
o compasso do berro,
no santo,
o século.
a mudar
de vida,
de mundo,
de marido e de mulher,
de filhos para os netos
de casa e de carinho
de juntos para sozinhos...

...para além de principiá-lo na palma de nossas mãos*, Maria.

Cidadade de Abeokuta, em Ogun na Nigéria.

 *Referência ao trecho da música "Maria" de Ary Barroso:
"Maria, o teu nome principia/na palma da minha mão"

27 de ago. de 2010

No Palácio de Oxalá

1.

Sentei perto da porta
No canteiro baixinho
Que deixa a gente
À vontade
Ou sem graça
De agachadinho.

2.1.

Feijoada para que te quero
E mais cerveja, por favor!
Tô de olho é naquele bolo
Viva a festa de yaô!

2.2.

Ipeté para que te quero
E mais cerveja, por favor!
Tô de olho é naquele moço
Viva a festa de yaô!
NUMAS

suavemente alagado
tudo
de um se dar sem conta
sonhos e toques enlaçados
cafuné crespinho

desabrocha
a flor do silêncio
perfumado carinho
aconchego melado
dentro de ninho.

CUTI (aqui)

19 de ago. de 2010

Rotina onírica


eu já andei
vinte quadras,
já tomei dois ônibus,
já corri por três ruas.

já cheguei em casa e esquentei a sopa,
já comi e repeti,
já liguei a televisão,
já conversei e xinguei o mundo.

sentei para produzir vinte linhas e dois traços,
bebi café
bebi chá
deitei para descansar.
o olho não fechou,
o pensamento persistiu,
minha cama agora tomba
a vida agora muda
a gente agora dança
e eu sou mais
 do que eu só.
("Serei para todo sempre meu bem,
Viu, meu mal?"

trecho de Paradoxo, de Mel Adún)



18 de ago. de 2010

Solilóquio

para os meus botões

na ponta da língua
na beira do fluxo.
pouco.
muito pouco ainda cabe.

ando mesmo insuportável

15 de ago. de 2010

Daqui vejo os navios.
Por mais cais qu'eu me negue
Vocês me chegam mareando,
Meu batismo de espuma,
Reparindo
E me tentando.

Nas areias nunca certas,
À mercê de suas farras,
Vem maré, vai sossego,
Me desfaço em tuas vagas!

Na beira de um mundo de sal.

11 de ago. de 2010

In Constância

Olha a dose...
Se pesar a mão nesse mel, eu danço.
E eu não sei dançar de dois.



Minha vela queima dos dois lados
Não durará a noite toda
Mas oh! Meu amigos
Ah! Meus inimigos
É de uma luz maravilhosa

COCO CHANEL

Josefine Baker
link

8 de ago. de 2010

BAG LADY - VIDEO - ERYKAH BADU


all you must hold on to is you, bag lady...
para os momentos de totalidade, na alegria e na tristeza.

4 de ago. de 2010

Mãe todo-poderosa, mãe do pássaro da noite (...)
Grande Mãe com quem não ousamos coabitar.
Grande mãe cujo corpo não ousamos olhar
Mãe de belezas secretas
Mãe que esvazia a taça
Que fala grosso como homem,
Grande, muito grande, no topo da árvore Iroko,
Mãe que sobe alto e olha para a terra
Mãe que mata o marido, mas dele tem pena.



cantiga para Iyá Mi Oxorongá


 

A Coruja, vizinha sumida,
volta depois de anos e

voando sobre minha cabeça.
vigiando meu caminhar.
trazendo o que em mim
há de mais regular!
Axé!

3 de ago. de 2010

Memory tea

Fora o dedo em sangue
Da noite que passei fiando,

Fora a renda pronta
E este sono me cegando,

Sigo chá pronto,
Sereno caído:
Sorvê-lo em um átimo
Sorriso rasgado
Fogo fato
Breve brasa.

Sigo.

Censo 2010

Cor
(  ) Pardo...

...à noite, nem todos os gatos são.


Durou pouco.

Quase nada.

Sete vidas,

Um só fôlego

Para massacre

Na madrugada.

24 de jul. de 2010

Ibiri

Templo de Nanã Buruku em Dassa Zumê
(foto de Pierre Verger)




Eu só tinha sede, meu imbondeiro!
Queria te ver.
Me disseram que o mar nasce de dentro de você.
Qual pássaro noturno no zênite do dia
Vou me aninhar nas tuas fendas,
Raízes da lama,
Pés de Santana,
Minha calmaria.


Tua pele ancestral, matéria da minha,
Cheira ao vinho que Oxalá
Bebeu até lembrar do que nunca esquecia:
Que o mundo não é feito em um ou sete dias
Se da palma fermentada bebe tudo o que não podia!

O que eu tenho é sede, ó baobá!
Pede a tua prima que abra o ventre para me saciar!


Barriguda e nuazinha
No inverno ela procria;
Pari painas tão branquinhas
Pr'Oxalá lhes fazer filhas!




Saluba Nanã!
Epa Babá!


(salve a família Bombacaceae)

22 de jul. de 2010

Memórias de um vício que não foi

.
Eu não fumo.
Maconha de vez em nunca.
Bebida, nestes tempos, é coisa rara.
Sexo? Já voltei a ser virgem.
Me deixem ao menos com o meu café!!!
.




Um achado este!

Perdido num canto qualquer.

Ai, que drama! ahaha!

Me rendeu uma boa risada hoje.

20 de jul. de 2010

Guia

Moema, Victor Meirelles (1866)


Iemanjá que me leve, kalunga dos meus dias!
Para jazigo na praia
Areia serena
Moema é minha guia.


junho 2010
(há três links na postagem)

Heráclito

Ai, porque me anoiteço?
minha escrita fria de pés conjugados
meu caminho maldito,
meus sapatos de barbas de molho, pêlos alheios.

Ai, porque não durmo
e me rendo logo
e me entrego à dança torta das meninices afoitas?

Quanto doce, meu deus!
quanto doce me derrama na cara
me lambuza o queixo
me contorna a boca
sem nenhuma gota
nenhuma gota me roçar a língua e me fazer feliz por toda a próxima eternidade!

Ai, me lamento quente
e no fundo do meu taxo te espero cá, na várzea
para cheias de julho,
chuvas ocasionais de uma eterna seca.

Meu rio que sempre corre.

17 de jul. de 2010


Fool's errand (2006)
de Nancy Baker
errand. recado, mensagem; pequena incumbência
fool. tolo, néscio, idiota

bruxa, vida!


The Witches Flight (1798),
de Francisco Goya

quem nunca?


Conversations I've Never Had,
de Martha Verschaffel

15 de jul. de 2010

São Paulo

varar este estado como
quem se auto-deflora.

saqueando os ipês.

13 de jul. de 2010

cresce vivo e sanguíneo nadando por entre as folhas
passeando nos meus cabelos de hera
minhas mãos investigam minunciosamente os lugares onde deixei repousar a cabeça.

estava perto, estava alocando paixões.
estava tentando acordar e vencer a cegueira,
a mudez que me ataca olhos,
ah, meus olhos de pedra onix, capricornianos rolados!

viro a moeda da minha loucura.
quero obscurecer a lua.
quero nascer no sangue de jorge e projetar minha voz na ponta da lança.

8 de jul. de 2010

(3

feriadão:
três dias sossegando no limbo para uma vida de paraíso.
recesso.

que seja menos febril e mais lunar.

Aruanda - inda que eu seja o céu para minhas tempestades,
garôo de baixo para cima. )


"que seja doce"
Caio F. Abreu

6 de jul. de 2010

ruas

dobrei a esquina
para ver se te desencaminho.

enquanto refaçominhas sinas.

2 de jul. de 2010

vento

entre o silêncio e a palava
há um sopro vacilante
há uma boca quase seca
há uma saliva aflita
um pensamento sujo
um querer fronteiriço
um pedido de asilo
de arroubo.
há um coração balbuciante
um estertor suspenso no nascimento.

nada mais há de me suportar nos limites.

27 de jun. de 2010

sol

só duas córneas sob um sol quatro e meia,
tarde de nuvens desaparecidas.

brasa.

14 de jun. de 2010

Torta de banana com canela e açúcar

e eu sei o que foi aquilo tudo.
como uma vida pós-Bahia:
banho frio de manhã cedo e paz na correria.

hoje estou particularmente cansada.
trocando coração por cabeça.
colocando o mundo no meu lugar.
tem vezes que é assim, a gente se distrai da vida.

13 de jun. de 2010

Poema de amor de Jaci para Antônio


Cutucou minha janela,
já era funda a madrugada.

Sangrou meu sono como sacrifício para tua serenata.
Se sangue fosse aquilo que no sono mais me faltava
E se fosse só em sonho o lugar onde eu mais te amava
Uma bela surra tu levava!

Querer assim não se desperta,
Não se cutuca nem se mata
E se um dia eu for Amor
Serei o teu e mais nada!

10 de jun. de 2010

Conheço as tuas obras: não és nem frio nem quente. Oxalá fôsses frio ou quente! Mas, como és morno, nem frio e nem quente, vou vomitar-te.

Apocalipse, 3:15-17


"E com a espada ele afugentou a Morte e as suas sombras.
Ogum fez o que pôde para socorrer o amigo,
com a faca retirando o ori frio grudado no ori quente.
Na operação de Ogum as duas cabeças se fundiram
e o ori de Oxaguiã ficou azulado,
um novo ori nem muito quente, nem muito frio.
Uma cabeça quente não funciona bem.
Uma cabeça fria também não.
Foi o que se aprendeu
com a aventura de Oxaguiã."

Reginaldo Prandi, "Mitologia dos Orixás"


...acerca do morno

4 de jun. de 2010

Corpus siccus

seis meses...
e coroando a concha graciosa
safa-se rainha-varona da botija doirada.

era para ser desde sempre.
era o fruto já mordido
e o sabor saturno
da boca do Lácio.

fecunda teu corpo, filha!
toma teu mundo
é o corpo e é o sangue
tape(te)ados, vez ou outra,
por duas insones
xícaras de café.

25 anos de
Corpus Christi

1 de jun. de 2010

coisas

Um pulo dentro do peito.
Algo se esparrama e encharca.
Me amortece e eu aceito.

2008/2010


EMBRIAGUEZ

"Você não chegou cambaleando, chegou reticente"
2008


Adoro a cor e o brilho disto...

30 de mai. de 2010


reflexão
;)

sem

será que a gente tem que fazer a cabeça,
nascer tudo de novo
para poder virar na gente mesmo?
para poder (re)tomar o corpo
e dançar com os pés bem assentados no chão?

é que faz semanas
que eu não estou em mim.

e os exageros...
os antagonismos...
eles roubam-me as rédeas.
cavalgo em falso.
"Devorar meu corpo
seria o menor dos males
mas você esqueceu alguma coisa intacta
vagueando o meu ponto cego"


Nathalie



29 de mai. de 2010

Pingado

é de manhã.
a luz já acabou,
já voltou.

vi algo voando janela afora.
era meu sono, cansado de me
esperar para esquentar a cama.

são poucas as coisas bonitas,
simples e boas que esperam.
agora eu não sei citar nenhuma.

mas o sono, este de Morfeu...

.

comecei a escrever uma carta,
desespero frívolo de amiga desamparada,
e insoniada.
a eletropaulo veio e cortou meu "oi".
agora eu ligaria para todo mundo.
e escreveria para aqueles que não atendem
o telefone ou dormem, gadaiam, de madrugada.

penso em pegar o jornal e tomar café-com-leite.
penso em tudo o que eu queria agora num gole
de pingado!

"são poucas as coisas que esperam"

ouvia djavan e meu sono ficava lá da cama:
- trouxa, idiota!

ouvia "se"...
- idiota!

ouvia "pétala"...
- perdeu, playboy!

.

minha vó dizia que não tinha coisa melhor que
beber água e mijar!
e dizia que o sono é complicado...
e não é que é?

leite!
leite com canela...
grande vó!

e a percepção destes momentos vale por um porre!
não que seja bom...
mas é nestas horas...
ai, meu deus!
É numa pequena hora destas
que eu sinto uma vontade imensa de você!

28 de mai. de 2010


este toque que te dou vem dos nós mais atados
que trago no ventre remoendo minhas raízes fingidas
de memória e nostalgia genealógica.

este olhar mais agudo, de um erotismo cru e lancinante, traz para junto de mim uma noite submersa em livros e concreto armado: as horas passadas nas frestas dos teus olhos, na ponta dos teus dentes me ferindo a carne marinada no dendê.
(Ogunhê!)

fico alerta de novo.
no caso de tormentas: maio e junho, impérios dos ventos mórbidos, os ventos frios, a cavidade deserta, o visgo, a sorte lançada no caos.




Maio 07


Algo de mim ficou naquele pó
Rolando na nuvem rente ao chão.
A terra parecia provar nossos pés,
aguando os restos do nosso viço,
cercando o doce do nosso café.

Era uma primavera sutil.
Era uma pétala em veludo
a se instalar na rouxidão...



Más notícias, Rodolfo Amoedo

Éramos oito mulheres de 20 a 60 anos...
Todas extremamente envolvidas por
esta senhora de Amoedo...
Por mais de dez minutos
moramos expremidas entre seus dedos,
vivemos de respirar seus através de seus poros
e brincar nas suas rendas.



25 de mai. de 2010

Não ia sair de casa sem uma companhia para um papinho no ônibus até a Paulista.
Ele era assim velho, levinho, era poesia e falava uma língua que parecia a minha mas para a alegria dos meus encantos, não era!
Era o Neruda de mamãe.


OTRO

De tanto andar una region
que no figuraba en los livros
me acostubré a las tierras tercas
en que nadie me preguntava
si me gustaban las lechugas
o si prefería la menta
que devoran los elefantes.
Y de tanto no responder
tenfo el corazón amarillo.

Pablo Neruda

22 de mai. de 2010

Hoje eu vou dançar um zouk em Veneza.
E só não chego em Roma por falta de boca.
Minha vó ensinava um truque para proteger contra inveja capilar:
beija o cu dela, beija o cu dela - para repetir assim, na cabeça, no decorrer dos elogios, não para dizer para a pessoa ou para ir de boca e...

Não falo coisa com coisa, tudo me sai assim, como se tivesse acabado de chegar, a língua tropeçando na urgência, o orgulho pulando pulando fogueira, se queimando e amansando, tropicando e se estabanando todo no chão!
Ai, vó...
Ai, vó...
imbranata! - me sussurra toda maliciosa! E ainda vira e cutuca a dona Norma, que se rola rachando o bico!

Imbranata! Toda besta! Toda boba!

Tinha dois anos e tentava dizer o nome dela: Vó-Ma-fal-da.
Mas só saía assim: vó-fo-da.

né???

para ler ouvindo Per Amore
cantada pela Zizi Possi
com cenas de novela.
;)